Comida de infância, comida de mãe, agora, passou a ser comida pra mãe no cardápio de todo dia na minha cozinha. Se a velhice dá uma marcha à ré no tempo e traz a criança de volta, e se contra isso quase nada pode-se fazer, então o caminho é procurar aceitar e fazer essa menina contente usando as ferramentas que se tem à mão. As panelas sempre foram motivo de alegria para minha mãe, tanto no preparar como no comer, e também nisso somos parecidas. Na rotina doméstica, no sem-fim de tantas e tantas tarefas, escolho sempre, sem pensar nem uma vez, cozinhar. Mesmo que destreinada dessa lida diária, voltei a gostar da "agenda culinária": pensar no almoço do dia seguinte antes de dormir, colocar feijão de molho na véspera, passeios à fruteira, ao supermercado, à padaria, ao açougue... Melhor ainda é que nas últimas semanas minha mentora gastronômica tem me acompanhado em algumas dessas compras, saudosa que andava das idas ao mercado, seu programa preferido. Comove-me vê-la entusiasmada como criança por balas com as batatas rosas novas, imaginando um belo purê, com o cheiro do abacaxi, o perfume das uvas, dos pães, com a variedade de feijões, sua maior paixão que não pode faltar mais do que um dia... E nessa roda-viva de café da manhã, almoço, café da tarde, janta (e eventuais lanchinhos nos intervalos), muitos sabores esquecidos vão sendo resgatados. Assim como sua memória, afiada ao passado, volta e meia lembro de algum prato lá de trás, da mesa da sua cozinha, que há décadas não experimento. Semana passada, foi a vez das moranguinhas recheadas. Seus olhos faiscaram ao deparar-se com um cesto das morangas em miniatura no supermercado, e pensamos em dueto: Vamos fazê-las recheadas?! É claro que vamos!! Querem ver um dos pratos que mais me impressionavam quando quem cozinhava era minha mãe, e eu só sabia admirar suas habilidades?
Para começar a dar cara de panelinha à pequena moranga, recorta-se a tampa.Retira-se.
Com uma colher de sobremesa, raspa-se o miolo pra retirar as sementes.
Recheia-se com carne moída refogada com temperos e ovos duros picadinhos.
Recheia-se com carne moída refogada com temperos e ovos duros picadinhos.
Fecha-se a panelinha e enrola-se em papel alumínio para ir ao forno em temperatura média por mais ou menos 4o minutos.
Abre-se o pacote com cuidado e, depois de fazer o teste do garfo, se estiver macia é chegada a hora de visitar o passado de garfada em garfada.
O almoço que contou um pouco da nossa história, além do gosto bom da comida simples, foi também terapêutico. Voltar à mesa comandada pela mãe, mesmo que pela luz já enfraquecida das minhas recordações, fez tanto bem a mim e a ela. Ainda hoje, ser lembrada como uma boa cozinheira é um carinho extra ao seu feminino provedor. Por tabela, uma terna alegria à maestra das minhas panelas que aprendi a ser com ela.
Que continuemos firmes nos nossos pontos fortes, aqueles que nos ancoram e, graças aos céus, nos divertem. Amém.
Que continuemos firmes nos nossos pontos fortes, aqueles que nos ancoram e, graças aos céus, nos divertem. Amém.