sábado, 7 de agosto de 2010

Ao meu crafter pai

(foto: getty images)

Minha mãe conta por toda vida, com orgulho estampado nos olhos, que entre tantas habilidades, meu pai também tinha "vocação" às artesanias e inclusive colaborou em várias peças do enxoval. Mas, naquele tempo, isso era um segredo de estado. Enquanto namoravam na sala, ela bordava a toalha numa ponta e ele, noutra. Sentavam estrategicamente de maneira que no primeiro movimento próximo, ele largava a sua parte sobre o sofá e fazia "cara de paisagem" assim que meu vô aparecia. Garantia dessa forma sua imagem de homem viril, e o futuro sogro, com certeza, admirava a cena meiga da noiva bordando enquanto o noivo, bem comportado (e ai que não o fosse!), pensava em "outras coisas".
Mas ele não jogava a toalha, e assim que o "fiscal" dava as costas, voltava aos pontinhos da pintura de agulha que iam preenchendo o tecido e desenvolvendo sua sensibilidade.

(Seria um amor-perfeito que eles bordavam a quatro mãos no presente projetando o futuro? Imagem Google)

Outra cena muito lembrada na história do casal arteiro, e que também não tive a alegria de presenciar, pois eu ainda era um plano futuro, é a de uma famosa saia godê que ele, sentado no chão, cortou e depois costurou para sua amada. Dizem que era um arraso quando ela desfilava pelas ruas leopoldenses exibindo a peça de grife exclusiva, com sua cinturinha de manequim, como gosta de frisar.(rs)
Tenho uma memória péssima, mas catando daqui e dali nas gavetinhas da infância, encontrei a imagem desbotada do moço prendado tricotando um blusão verde (ou azul?) petróleo, com suas mãos grandes e unhas roídas, num ponto que a cada carreira mostrava os losangos se encaixando com perfeita simetria. Por muitos invernos, ele o aqueceu, e observando com olhos de criança, lembro que me perguntava como era possível fazer geometria com fios de lã.
Para sua princesa, eu!, fez o mais lindo quebra-cabeça com o mapa do RS e suas regiões recortados em madeira, com serra tico-tico, e depois coloriu com tinta no maior capricho. Maior orgulho não poderia sentir uma filha quando levou à escola para mostrar aos colegas e professora e ela, entusiasmada, utilizou como recurso didático em uma de suas aulas de geografia.
Imagino a cumplicidade que as manualidades partilhadas teceram na vida dos meus pais.
Imagino o encantamento da minha mãe por um homem que desafiava as regras e partilhava do nicho criativo do seu universo feminino.
Imagino, porque não recordo, como ficávamos próximos quando, sentada no meu banco ao seu lado, contava junto as voltas dos finíssimos fios de cobre que pacientemente ele enrolava para bobinar motores.
Se ele passou tão rápido por aqui, com o coração derretido muitas vezes reconheço nas mãos de seus dois netos, que por uma ordem do tempo não cruzaram com o vô Ruy, a continuidade do seu ser sensível, habilidoso, metódico, apaixonado pelos processos criadores.

Vicente entre as panelas , praia que o vô não surfava, mas com o mesmo perfeccionismo...

Bruno em diferentes motivações que envolvam cortar, colar, pintar, montar, costurar...

E também nas mãos gêmeas das dele do meu irmão, prestativas e eficientes em qualquer tarefa engenhosa.
E milhares de vezes nas minhas, que me dão o norte e fincam as estacas do que me envolve de prazer e me põe de pé em defesa da beleza da vida. A herança mais preciosa, um bem de raiz que se perpetua pelos vínculos eternos do bem-querer.

Para o meu pai, o presente é um Ho'oponopono, que acredito irá encontrá-lo, quem sabe hoje, vovozinho, tricotando em alguma nuvem:
Sinto muito, me perdoa, eu te amo, sou infinitamente grata!
(Para conhecer ou saber mais sobre essa técnica de cura emocional havaiana, clique aqui e se conecte com os amigos do Via Tarot.)


Amém!

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Sinais de fumaça...

... das chaminés dos fogões e lareiras anunciam que a tão aguardada neve chegou ao Sul, ponto alto do inverno gaúcho, na congelante noite passada. Mais uma vez, o antigo desejo de ver o espetáculo fica dormindo na gaveta dos sonhos, porque se vivo num "eterno domingo" nessa nova rotina mansa, em volta, o "povo" de perto segue com suas agendas lotadas de um sem-fim de compromissos. Quem poderia se dar ao luxo de subir à serra em plena quarta-feira de trabalho?... Então, fico por aqui, feito ostra, plagiando a amiga Taia, rastreando as novidades climatológicas à distância...
enroupada como a chola no meu baú, faltando apenas o chapéu (que me lembrou dessa outra amiga aqui desfilando com um bem parecido)...
e com os pés sobre a bolsa de água quente para ressuscitarem do estado "picolé", vestidos das meias tricotadas há muitos invernos pela amiga Susi. Susi que veio da terra da neve intensa, do fondue, chocolate e canivetes famosos, que ama o verão tropical e garante que nevasca é muito linda como acontece no Rio Grande, por tempo curto, porque mais do que isso é ideia romanceada (será?) vendida nas telas, páginas, fotos... Seriam as violetas-dos-Alpes propaganda enganosa, Su? Viradas do avesso, essas meninas que já nascem "do contra" e logo mudam as regras do jogo, curvando-se e movimentando suas pétalas para o alto em pose de rainhas, enfrentam o frio sem perder a elegância, honrando suas raízes europeias, e me encantam.
Honrando pouco minha origem, "apanho" para fazer um fogo, mas "fumegar" é preciso, mesmo que a neve esteja a 100 km...
mais ainda quando o gás termina já quase madrugada, o botijão reserva está vazio e os pudins para a festa da sobrinha precisam cozinhar... Final feliz para a sobremesa que teve calma, passou a noite em banho-maria e terminou de assar no forno do fogão na manhã seguinte.
Sinais (evidentes) de fumaça, que não me incomodam nenhum pouco, estão por todos os cantos da casa, nas roupas e nas invenções dos últimos dias, como nas almofadas que aquecem a vontade de crochetar, costurar, pintar...
e lembram dos ciclos: a estrela de lã, tão convidativa a um abraço nesse invernão, e a fada de seda (nascida numa fase curta de entusiasmo pelo trabalho "trabalhoso" da pintura em seda e costurada nesta semana), tão suave e geladinha, à espera de um colo no verão. Entre elas, a menina feliz, incorporada de primavera. Todas, devidamente defumadas, incluindo-me (rs)...
e o Bibi, que mesmo com seu casaco de pele, busca refúgio nos lugares mais inusitados, de preferência as sacolas, paixão sua em todas as estações.
E sigo por aqui rezando a mesma reza de muitos gaúchos: Que não me falte lenha, nem teimosia para continuar amando o inverno. Amém! (Aguardo sinais de fumaça daí... rs)

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Mestre que é mestre...

... semeia em nossa vida bons ensinamentos, por teoria, conhecimento, mas sobretudo por belos exemplos. Assim é com a Nilda, minha mestra e madrinha no aprendizado de "mandalar". Privilégio dos grandes conviver e poder se inspirar pela sua arte e sua postura íntegra e sábia na lida com os caminhos da existência. Se hoje se apregoa a necessidade do desapego, para que se abra espaço ao novo, e acredito nessa lei de movimento ou estagnação, há semanas acompanho o desenrolar de uma decisão sua exemplar de doação. Com entusiasmo, aos poucos foi dando forma à Exposição de Desenhos - Retrospectiva, um acervo montado em mais de duas décadas, que inaugura na próxima quinta-feira, dia 5, às 18h30, na Villa D´Assisi (espaço que comentei aqui quando encontrei com a Cecília).
Os trabalhos, quase 30, de diferentes fases, técnicas e temáticas, estarão à venda a preços muito razoáveis para facilitar a aquisição e garantir que a renda recolhida seja satisfatória à causa que motivou a mobilização e despreendimento da artista: uma verba extra para a Associação Pandorga, aqui da cidade, que dá assistência a crianças e adolescentes deficientes, a maioria, autistas. Para conhecer a instituição, sem fins lucrativos e do maior gabarito no atendimento, clique aqui.
Confira o que reserva aos que visitarem a mostra pela sensibilidade de outra mestra, professora de Literatura lá dos tempos do ginásio, que faz a apresentação no convite num texto primoroso, confirmando que os "feras" se entendem:
(clique na imagem e transporte-se à alma de Nilda pelas palavras de Elvira Hoffmann)

Então, para quem é de perto, fica o convite para se juntar a nós na quinta-feira à tardinha, para curtir a beleza plástica, a beleza da iniciativa, a beleza também da música na apresentação do Quarteto do Museu, que deu corda à boa-vontade e engajou-se na causa. Quem sabe, a beleza também passe por encontros com quem passa por aqui e poderemos trocar abraços. Será uma alegria grande!
E para quem é de longe, que respingue por aí a energia gostosa dessa super(ação). Amém!

A exposição fica aberta à visitação até 5 de setembro, das 15 às 24h, na Villa D´Assisi, na Avenida João Correa, 896, esquina Rua Marquês do Herval, São Leopoldo, RS.